Of love and shadows

28 de julho de 2012


Na véspera de te ires embora começa a formar-se sobre a minha cabeça uma leve nuvem negra. À medida que os dias avançam a nuvem começa a tomar contornos capazes de preocupar a Protecção Civil e de a levar a decretar estado vermelho em todos os distritos de Portugal continental e ilhas. Escurece a nuvem. Torna-se preta demónio. Expele raios e coriscos como torrentes de lava. Desce sobre a minha cabeça, dela só sobressaindo as minhas orelhas e a ponta do meu nariz. Transformo-me em nuvem e transito pelos dias numa espécie de transe auto-infligido. Se fizer de conta que o tempo não existe não o sinto passar e acumular em folhas brancas de silêncio.

Quando tu não estás só existe silêncio. Só existo pela metade. Finjo a docilidade e a candura que dizem serem minha característica para que a ordem do meu mundo não se quebre mas é complicado resistir à vontade hercúlea de gritar com toda a gente. Quando tu não estás só me apetece gritar com as pessoas e pareço ficar cega às qualidades, só lhes vejo defeitos. E não me apetece sorrir. E tudo em mim é um rastilho de mau humor que qualquer faísca, por mínima que seja, o pode fazer acender rumo a um resultado imprevisível. E não gosto de mim assim, tão no limite da tolerância.

Quando tu não estás o cansaço é mais incisivo. Custa mais a dormir. A cama é, ao mesmo tempo, demasiado grande e demasiado pequena. Todas as almofadas não chegam e nenhuma serve. Falta o teu corpo, a tua pele, o mandares-me calar porque ressono a toda a bolina. O acordar e chegar-me a ti para a melhor parte do sono.

E risco no calendário todas as provas da tua ausência mas, ainda assim, os dias somam-se e eu contabilizo. E encolho-me. Aquieto-me. Fundo-me com a poeira ao canto dos móveis e almejo ficar aí onde ninguém me vê nem eu tenho percepção do mundo.

Depois, na véspera do teu regresso, um subtil anticiclone faz dissipar a nuvem negra e a cor regressa aos meus olhos. E consigo ver-te novamente. E ver-me. E ver-nos. Só então recomeço.

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