Da condição feminina

10 de julho de 2013



























Também a ler “Teresa e Isabel” de Violette Leduc – a tal novela tanto tempo censurada e tão tardiamente publicada – ocorreu-me ir ver em que ano foi publicado “Sexus” de Henry Miller. E qual o meu espanto – ou não – quando a wikipedia me revela que foi publicado em Paris – espantemo-nos com a cidade – em 1949. E espantemo-nos com a cidade porque, cinco anos mais tarde, no mesmo local das luzes e da modernidade, Violette Leduc vê recusada a publicação da sua novela. O porquê já sabemos. É um porquê que continua com amarras bem presas nos dias de hoje.

Leduc era mulher. Primeiro ponto. Bastaria apenas este.
Segundo ponto, Leduc era mulher e era lésbica.
Terceiro ponto, Leduc era mulher, lésbica e falava sem pudor e em pormenor da sexualidade e sensualidade femininas.
Quarto ponto, Leduc exultava o prazer feminino. Como podia tal?
Quinto ponto – que deve ter feito muita confusão na cabeça daqueles homens – Leduc exultava o prazer da mulher às mãos de outra mulher.
Sexto ponto, Leduc falava da sua própria experiência. A definitiva ousadia.

De Henry Miller diz-se que não há escritor mais honesto. Talvez. Não sei. Tinha vinte anos e consegui ler metade de “Sexus” – nunca mais lhe peguei. Talvez fosse o escritor mais honesto mas mesmo que não fosse era meritório desse elogio pelo simples facto de ser homem e falar despudoradamente do seu pénis murcho incapaz de perform – entre homens não há honestidade mais crua. E não está mal, não é o seu talento que está em causa mas a forma como se fazia – e ainda se faz – a escolha do que é bom e do que não vale a pena. Num mundo fálico, o editorial também, é óbvio sobre quem recai a escolha e o escárnio com que se deita ao lixo o que, para eles, não presta. Para com a mulher continuam a ter certa condescendência. 

Sou levada a pensar que a novela de Leduc não foi tanto censurada pelo seu conteúdo e pelas suas descrições mas por receio de que a sua revelação levasse à libertação da consciência da mulher e à reclamação dos seus direitos como ser sexual. É uma bela teoria da conspiração, não?


Não sou feminista ferrenha mas tendo a ser cada vez mais feminista. Sou-o por observação – salvo raras excepções - do comportamento masculino no meu local de trabalho e pelo comportamento masculino de uma forma geral. Sou-o também pela observação de um determinado comportamento feminino mas isso são outros quinhentos. A verdade é que isso da igualdade, volta e meia, faz-me rir. 

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6 Responses to “Da condição feminina”

  1. Claramente.
    Algo semelhante aconteceu com a Lota, arquitecta paisagista brasileira, companheira da poetisa norte-americana Elisabeth Bishop, que tenho a sensação que tentaram (em vão) evaporar da História do Rio de Janeiro e do Brasil [Filme brasileiro "Flores Raras" e Livro "Flores Raras e Banalissimas".
    Tenho de ler esse livro!

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    1. Com tantas provas de que a diversidade é uma mais valia é irritante como se continua a fazer a apologia do que é "normal", moralmente aceite, padronizado. Das sombras não reza a História. A História é feita de quem ousou não ter o medo de perder tudo.
      E eu tenho de ver esse filme. :) Depois conta do livro.

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  2. Hum, tenho de ler esse livro.
    Também sou "Casualmente" feminista, sempre que tem de ser lá "queimo um sutian ou dois", engraçado que o faço muita vezes com mulheres, que conseguem ser ainda mais machistas que alguns homens!
    Já agora sabes se o livro está disponível em PDF ou noutro formato na net?

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    1. Olha, parece que o livro esteve disponível no scribd mas já não está lá. Pode ser que encontres alguma versão brasileira mas ler "ninfetas" em vez de "jovens raparigas" a mim tira-me o apetite para o ler... ainda mais quando procuro o significado da palavra e me aparece isto: "Uma ninfeta é um estereótipo de menina adolescente sexualmente hiperdesenvolvida e sedutora." Tudo o que elas não eram... lol. Se tanto eram umas ninfetas um bocado taralhoucas. Mais taralhoucas que ninfetas... sim, bem mais taralhoucas.

      Existe uma edição da Livros do Brasil, que é a que eu tenho e que podes tentar encontrar ou na biblioteca da tua cidade ou tentar encomendar nalguma livraria. Pode ser que a editora ainda tenha stock e não o tenha vendido na integra a esses mercados de livros baratos que agora há por aí.

      Agora, prepara-te, é daqueles dramalhões franceses que a páginas tantas te faz querer dar uma par de estaladas nas gaiatas para ver se elas atinam. Mas lido à luz da altura em que foi escrito e considerando o quanto custou edita-lo... é muito interessante.

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    2. Ah, mas eu gosto de dramalhões franceses! Vou procurar :)
      Obrigada

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